Sobre a Psicoterapia
Adenáuer Novaes • 18 de janeiro de 2021
Sobre a Psicoterapia
A Psicoterapia é uma área clínica da Psicologia que visa a cura ou alívio dos problemas psíquicos humanos. Ao buscar restabelecer o equilíbrio psíquico, a Psicoterapia leva a pessoa a uma compreensão precisa do que lhe ocorre. Assim, o indivíduo busca os meios para solucionar os seus conflitos e, mais que isso, encontra maneiras mais adequadas de viver no mundo de forma saudável e com um sentido existencial.
Na prática psicoterápica há de se considerar que ali encontra-se uma pessoa, com sua mente interagindo diretamente com outra, num campo legítimo e alquimicamente estabelecido. Isto é algo que vai além das ilações dos estudiosos, das teorias e técnicas que se possa utilizar. Neste campo, os conceitos espíritas têm dado uma grande contribuição, pois o próprio sujeito em terapia tem trazido conteúdos de natureza espiritual, requerendo um olhar mais amplo, menos acadêmico e, portanto, não dogmático, mesmo que sejam compreendidos como simples crença pessoal.
A compreensão da reencarnação, da mediunidade e, sobretudo da imortalidade, é de grande valia, sem que se configure uma relação doutrinária ou de natureza religiosa, muito menos uma tentativa inconsequente de imposição de crenças. Quando estes temas são tratados de acordo com definições moralistas, religiosas ou como descritos em livros considerados sagrados e incontestáveis, ocorre um distanciamento do fenômeno real e de natureza psíquica e espiritual de que são revestidos.
Os fenômenos espirituais trazidos pelo indivíduo ao ambiente terapêutico devem ser tratados como eles são, sem julgamento precipitado nem sob qualquer tipo de paradigma, por parte do profissional.
A ciência acertadamente sempre buscou um distanciamento de temas religiosos, porém agora se trata de dados de realidade que naturalmente emergem das experiências humanas e não são fabricados pelas crendices fantasiosas de uma consciência cheia de medos ou submetida a determinações sacralizadas pelos sacerdotes das mais diversas religiões.
Contra fatos não há argumentos nem se pode desprezá-los por causa de convicções contrárias e a Psicoterapia precisa se debruçar em estudos sobre neste campo.
Na relação terapêutica não há mais lugar para conversas de autoajuda nem conselhos de como se livrar de pensamentos e pesadelos com monstros imaginários, de como arranjar um parceiro ou de como sustentar um casamento naufragado, sem que a análise não se aprofunde na busca pela Designação Pessoal que vá além da vida do atual personagem.
Isto, porém, não deve ser imposto ao paciente, pois ele pode vir, e geralmente vem, com demandas completamente diferentes. O Espírito quer mais do que uma psicoterapia que o estabilize momentaneamente em sua psiquê consciente. Quer saber mais sobre si e sobre seu destino, sobre o que está fazendo no mundo e como mudar, cuja tarefa a psicoterapia pode contribuir para que ele mesmo encontre suas respostas.
De um lado, o Espiritismo deve contemplar em suas fileiras, paralelamente ao seu viés religioso, proposições e atividades fora do domínio de uma excessiva moralidade que dificulta a percepção do fenômeno em si. Caso contrário, continuará sendo tão somente um movimento religioso como outros. Do outro lado, a Psicologia deve contemplar a perspectiva espiritual não religiosa na análise do sujeito e dos processos psíquicos de sua mente relacionados ao comportamento.
Em psicoterapia é fundamental a percepção e distinção do que é o comportamento descrito e observável e do que são as tendências do indivíduo. A análise deve ir além da proposta de sua conscientização para mudanças de comportamentos requeridas, alcançando a percepção das tendências que os geram.
Quando a perspectiva engloba a visão de que se trata de um Espírito em processo de conscientização de si mesmo, a percepção vai mais além do que a atual Psicologia oferece. É preciso analisar os estigmas, as tendências do Espírito que são avaliadas após circunstanciada biografia, os arquétipos principais não vividos ou vividos de forma exacerbada, os comportamentos verbalizados e os observados, os traumas, as ocorrências inusitadas, as desagradáveis na vida atual, as possíveis influências espirituais obsessivas, as experiências numinosas havidas, os tratamentos realizados ou em curso e as características de personalidade do atual personagem. Todas estas considerações devem ser analisadas à luz de diferentes paradigmas, sem se ater exclusivamente aos ditames de determinada teoria ou escola psicológica.
Estigmas
são características de personalidade que enviesam o pensar e a conduta do indivíduo. Podem ser físicos ou psicológicos, conscientes ou inconscientes, implícitos ou explícitos, herdados ou não, inatos ou adquiridos.
Nem sempre percebidos, provocam vieses no modo de conceber a realidade e na forma como o indivíduo vivencia os eventos do cotidiano. São direcionadores do comportamento e da maneira como a vida é sentida. Nem sempre são negativos ou trazem constrangimento ao indivíduo. Em geral discriminam e provocam complexos psicológicos que carecem de conscientização. Necessitam de análise detalhada, pois fornecem importantes elementos da personalidade, do mito pessoal e do sentido da vida. Quando tornados conscientes e têm seu significado compreendido, promovem bem-estar e se tornam marcos para novos projetos de vida.
As tendências
são macro condicionamentos do pensar, do sentir e do agir humanos. São direcionadores psíquicos, à semelhança de arquétipos, que influenciam o modo como os comportamentos acontecem. Contêm vetores compensatórios, aliviadores de angústias e de culpas, situações prazerosas, modos de ação que resultaram em êxito, gerando prazer e satisfação. Tornam-se canais por onde flui a energia do viver e por onde a vontade encontra meio de manter um fluxo dinâmico para que o comportamento se materialize. São passíveis de mudanças, porém requerem forte experiência renovadora em direção diferente do fluxo da coagulação do comportamento.
Mudanças de atitudes nem sempre promovem alterações nas tendências, muito embora favoreçam. São modos típicos de agir, por força de experiências repetitivas em vidas passadas, que resultaram em algum aprendizado ou em ganhos para o indivíduo. Delineiam a personalidade, tornando o comportamento previsível e, pelo hábito, formam uma imagem característica da pessoa, nem sempre visível a si mesma. Um comportamento não define por si só uma tendência, muito embora apresente características que favorecem sua percepção. É com o conjunto de comportamentos, sobretudo quando se analisam várias encarnações de um Espírito, que se percebe algumas tendências típicas que são verificadas nos modos de vida de seus personagens.
A personalidade de uma pessoa, por mais que apresente uma persona bem definida, não é suficiente para o entendimento de suas tendências, visto que pode se tratar de algo momentâneo, impulsivo e respondente a um estímulo casual. As tendências de um Espírito são úteis na definição de seu mito pessoal, pois direcionam a vida do indivíduo para a obstinação de uma meta.
Os arquétipos
principais não vividos ou vividos de forma exacerbada contribuem para comportamentos característicos que merecem a consciência do indivíduo. Os principais arquétipos são o Self, o Materno, a Ânima/Ânimus, o Paterno, o Religioso, a Criança, a Sombra, o Herói e o Velho Sábio. Mesmo não sendo um arquétipo, incluo o complexo funcional da persona, pela relevância na vida relacional humana. O Self, ou Si-mesmo, é o arquétipo direcionador da realização do sentido da vida e formador da personalidade geral como uma imagem idealizada do próprio indivíduo.
As relações afetivas com seus complexos processos muitas vezes trazem conflitos do indivíduo com o outro e com a sociedade, carecendo de compreensão e de soluções. Quando não se consegue vivenciá-los adequadamente, surgem frustrações, angústias e o estabelecimento de vários complexos psicológicos.
Os comportamentos manifestados e os observados são aqueles que o próprio indivíduo relata e deles parte para justificar sua procura terapêutica e, dentre os observados diretamente, há os que são presumidos a partir da análise de seu Inconsciente. Pode-se observar a possibilidade da não verbalização de outros comportamentos e características da personalidade por defesa contra a possível má interpretação alheia. São camuflados, omitidos ou alterada a sua realidade para obter-se uma boa imagem.
Por estas razões a análise dos sonhos, das fantasias e dos estigmas torna-se valiosa para uma melhor compreensão e percepção das tendências do Espírito. Também ocorre a omissão inconsciente, pois o indivíduo que busca uma terapia parte do pressuposto de que há um determinado conjunto de sintomas por ele escolhidos que são suficientes para a compreensão de seu problema.
Os traumas, as ocorrências inusitadas e os acontecimentos desagradáveis na vida atual devem contemplar todas as fases, passando pela infância, adolescência, idade adulta, meia idade, maturidade e velhice. As experiências vividas nestas fases, ao mesmo tempo que indicam as próprias escolhas, também confirmam as tendências do Espírito e retornos cármicos ocasionados.
Acidentes, doenças, experiências de quase morte, inimizades, perdas, separações, mudanças bruscas na vida, prêmios inesperados e atitudes contra outra pessoa que modifiquem a própria vida são ocorrências que merecem, particularmente ou em seu conjunto, a análise detalhada em terapia.
O modo como o indivíduo vivencia as experiências, bem como se ocorreram nas épocas esperadas pela mentalidade coletiva, sobretudo se ele se encontrava na fase adequada para acontecerem, também serve de pista para uma boa análise terapêutica. Algumas experiências que não se configuram como trauma podem, a depender da personalidade, ressoar como tal, passando a ter enorme relevância para sua vida.
Porém isoladamente um trauma não responde pelo resultado da constituição da personalidade de uma pessoa, pois todos os outros fatores intervenientes para sua formação sempre estão exercendo sua influência.
É importante o relato de possíveis influências espirituais obsessivas ou não, isto é, quando uma pessoa desencarnada objetiva prejudicar o indivíduo que está encarnado, como também de experiências numinosas na vida do indivíduo. Tais relatos devem partir espontaneamente do paciente ou, quando houver informação da adesão religiosa ao Espiritismo, questionar o que levou a esta opção. Estas informações interessam tão somente para compor a análise terapêutica do indivíduo, portanto, não cabendo qualquer discussão sobre princípios pessoais ou intenção de cooptação religiosa.
A interferência da dimensão espiritual na vida psíquica não pode ser negligenciada, mesmo que não faça parte do repertório do que é verbalizado pelo indivíduo em análise. Esta consideração deve fazer parte das elaborações do profissional que detém o conhecimento sobre o espiritual, podendo, ou não, dele utilizar-se em suas proposições terapêuticas.
Há uma enorme fronteira entre o psicológico ou psíquico e o mediúnico a ser desbravada com cautela e discernimento apurados. Vale considerar que a análise sob o paradigma da imortalidade do Espírito é o grande salto que uma psicoterapia pode dar, com ganhos significativos para o indivíduo que a ela se submete.
A análise com o complexo olhar que envolve as dimensões física, social, psicológica e espiritual de um indivíduo põe a Psicologia Clínica em elevado patamar pela pretensão de alcançar em profundidade o íntimo da mente humana e de seu proprietário mor. Sem esta visão complexa minimiza-se o objeto, desqualifica-se seu valor e reduz-se a capacidade humana para enxergar o indivíduo em sua essência. Assim tem sido até então, porém se pode dar um passo adiante com coragem e arrojo característicos da própria ciência quando encontra algo muito valioso.
O complexo olhar diz respeito ao entendimento de que o corpo é um protótipo de algo mais elaborado, mais transcendente e melhor organizado que o pilota, de que o social é mais do que um cenário externo dissociado da mente que o observa, tendo seus conteúdos participação direta em sua construção, de que o sujeito da Consciência não é seu real Controler, pois lhe falta habilidade e conhecimento de sua dinâmica e de sua estrutura, e, por último, de que o espiritual é muito mais do que um certo grau de serenidade, concentração e desprendimento da vida humana comum.
Para saber mais sobre este e demais assuntos tratados por Adenáuer Novaes, veja as obras publicadas pelo autor. Este conteúdo foi extraído do livro: Psicologia, Mitologia e Espiritualidade.
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